quinta-feira, 4 de outubro de 2007

Eu nasci na época errada

Apercebi-me do erro épico cometido pelo destino quando ouvia, em certa exposição histórica, certo balaio de músicas e notícias anos 60-70. Ouvia aquilo com sorriso de criança, com o ar de alguém cuja felicidade foi encontrada no mais suposto disparate. Alguém que descobriu que esteve sempre no lugar errado, e enfim encontrou seu lugar. Mas tão logo minha alegria infantil se transformou num saudosismo senil. Voltei a minha época física quando, com dificuldade, levantei daquela cadeira cujo desenho arremetia a minha então descoberta época espiritual. Tudo e todos me pareceram demasiado incomuns, demasiado atuais.

Ouvindo vozes roucas e suaves, transportei-me por alguns instantes à vida universitária de meus pais, quando pensava-se duas vezes (até três) no que deixaria de ser apenas pensamento para ser fala. Os estudantes gritavam e cantavam para criticar. Os ídolos eram Chico Buarque e Beatles, e não... deixa pra lá. Eu queria, por alguns instantes mais, ouvir os reis do iê-iê-iê e, ali mesmo mexer os pés e os ombros como fazem meus pais e como nós, que não vivemos Beatles, achamos ridículo. Por muito pouco, não me deixei levar pelas músicas de protesto e não saí gritando "diretas já" no meio daquela gente.

Eu acredito em outras vidas, talvez acredite porque queira crer que vivi o que nessa vida não vivi. Ainda não sei onde nem quando passei meus anos de glória, se em 20, 30, 40, se dancei o Charleston ou a dança dos meus pais. Eu queria, também, ter sido hippie e ter-me vestido à paz-e-amor, embora o “amor livre” e a marijuana não me seduzam. Os mais variados trechos da história me aliciam insistentemente. Talvez tenha vivido todos. Talvez deva fazer regressão.

Se minha alma não se apossou de outros corpos, nasci na época errada. Vivo como se tivesse assistido às partidas de Pelé e à viagem de Gagarin. Eu vejo e ouço como uma conservadora. Eu rejeito valores e a moda séculovinteum. Tenho espírito velho sob essa carcaça que insistiu em nascer na era dos computadores e do funk.

11 comentários:

Thales Barreto disse...

Escrevi duas vezes semana passada sobre isso. Sentir-se fora de sua época. A primeira faz uma referencia ao Nélson Rodrigues.
(http://simulacros.wordpress.com/2007/10/02/os-mesmos/)
Ja em outro retomo Goethe. E seu famoso Werther. Eis aqui o link. (http://simulacros.wordpress.com/2007/10/02/de-werther-ao-funk/)
Algo parece errado, e quero crer que não sejamos nós. Acredito que é esse mundo que anda vagabundo demais e em um torpor maior do que toleramos. Bjos E gostei do texto. Até. ;)

Samir Oliveira disse...

Luana, incrível! Compartilho dos mesmos sentimentos, sinto um vazio enorme nesse tempo de indivualismo acrítico e (quase) acéfalo! Queria ter visto e feito tudo o que tu sabiamente descreves nesse texto. Ah, e eu ainda danço beatles como nossos pais dançavam ;) hehehe

Só não invento desesperadamente uma máquina do tempo porque DETESTO física.. Adorei o texto!

Carolina Tavaniello P. de Morais disse...

Meu Deus! Mais uma vez eu me vejo em tuuuuuudo que tu escreveu. E eu amo isso nos teus textos! Dá uma sensação muito boa saber que não sou a única. Às vezes, me sinto uma pata fora d'água, mas a partir de hoej vou sempre lenbrar que existe a Luana. hehehe

Beijos, adorei!

Unknown disse...

Sabe... muitas vezes me perguntei se era a única que queria ter nascido nos anos 60! Sim... eu sou o exemplo típico do que a Elis cantava: "Nossos ídolos ainda são os mesmos..."

E eu era o tipo de criança que remexia nos vinis e ficava escutando Elis, Beatles, Chico! Ahhh... meus ídolos até hoje! (Só abro espaço para os Los Hermanos)

Muito bom o texto... faço minhas as tuas palavras!

Ananda Etges disse...

Ótimo texto Luana!
Adoro teu vocabulário!
Cultissíma!
Por acaso o texto remete à Exposição da RBS? Amei aquelas poltronas! A gente viaja demais ali, né?!
Um beijo!

Luana Duarte Fuentefria disse...

Sim sim! No Ar servindo de inspiração.

Felipe Martini disse...

Há exatamente quarenta anos era executado Ernesto Guevara de la Serna.

Unknown disse...

Todos j� pensamos em algo como "ser� que perten�o a essa �poca? Esse pais? Essa vida?", creio eu, pelo menos alguma vez.
No meu caso, percebi que perten�o sim. Que estou vivendo o que tenho de viver. Que tive de ver o que vi, ouvir o que ouvi e deveria ter feito bem mais do que fiz. N�o acredito em outras vidas, mas espero fazer nessa, coisas que outras vidas, inclusive outras "vidas minhas" tenham orgulho de saber.

Detalhe importante. Fico feliz que vc tenha nascido nessa �poca tamb�m. Obrigado pela dica das cadeiras no col�gio... nunca te agradeci.
Bjos!

Anônimo disse...

Gosto de saber que nesta época ha mais pessoas como eu, e que ainda podemos preservar conceitos antigos mesmo vivendo em uma realidade tão material e sem moral.

Muitas das vezes sinto que não deveria ter nascido nesta época, isso porque minha maneira de pensar e agir são diferentes do modismo atual. Já me falaram que o que sinto é uma "Evolução do Espirito" pois não me identifico com coisas rudes/grosseiras e que agridem de certa forma o que está nas profudenzas do nosso coração, o amor.

Mas de qualquer forma, sou grato por ter nascido, sou grato por estar compartilhando esse sentimento e sinto que ainda posso fazer muito pelas pessoas.

Temos que "Viver a cada respiração" com coragem, força, determinação, buscando sempre a moral do espírito e nunca deixar de ser quem realmente somos.

Grande abraço pra todos que estão lendo o artigo da Luana Duarte...

Anônimo disse...

Só queria regredir no tempo, não me sinto feliz em 2012, adoro os anos 70/80, não queria ter saído dessa época. é muito estranho, é espiritual,realmente não sei...mas penso nisso todos os dias.

Anônimo disse...

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