Nunca compreendi a física. Sempre fui uma “zero à esquerda” em ciências exatas. Nunca pude entender como esse ser estranho e milimetricamente (hoje, nanometricamente) calculado poderia influenciar minha vida. Sempre fui regida pelas ciências humanas e, sobretudo, pelas relações humanas. Mas dia desses pude comprovar, na prática, que tudo está interligado. Meus princípios emocionais estão intrinsecamente ligados aos princípios físicos, aos quais passei, a meu modo, a compreender.
Foi numa dessas Porto Alegres chuvosas, nas quais os rostos parecem um espelho do dia. Não via sorrisos. Não ouvia vozes. Mas uma voz veio falar comigo, perguntando se eu tinha uma passagem de ônibus. Um menino, cerca de quinze anos, conformado com minha resposta negativa à pergunta, puxou conversa comigo. O assunto? Os motoristas que jogavam água na calçada e a futura “tijolada” que um deles levaria como vingança. E eu, pacificadora como sempre, proferi aquele discurso de “não faça com os outros o que não gostaria que fizessem com você”. E assim, a conversa foi. E assim, ele me disse do desrespeito que sofria. Que para mim devia ser mais fácil, pois estudava, trabalhava. E assim, eu falei de sua possibilidade de crescimento e ele falou de sua possibilidade de estudar. Sim! Ele tinha possibilidade de estudar e utilizar aquela inteligência em projetos de vida, e não de vingança contra motoristas.
Mas eis o ponto onde quero chegar: a física quântica.
Muito temos ouvido falar desse outro bichinho estranho para cientistas humanos como eu. Filmes, livros, conversas e mais conversas. Moléculas do nosso corpo que interagem com moléculas externas e fazem daquilo que somos aquilo que o mundo é. E é sobre essa tal capacidade do ser humano de mudar sua vida, concretizando sua vontade por meio do pensamento, que quero falar. Não preciso acreditar e compreender esse tipo de estudo para ter certeza de uma coisa: são nossos atos que fazem o mundo. Isso vai muito além e é mais fácil de acreditar do que o fato de meu pensamento poder mudar meu futuro.
O menino que vi na rua provavelmente sequer ouviu falar em física quântica. Espero que um dia ouça, depois de ouvir meus conselhos de voltar aos estudos. Mas duvido que saiba o que é uma molécula ou que tenha parado para pensar sobre o sentido da existência humana. Mas há uma coisa que ele conhece melhor do que muitas pessoas: as relações humanas. Ele certamente sabe diferenciar tratamentos pessoais. Ele seguramente também não conhece o princípio da “ação e reação”, mas sabe reagir a um ato grosseiro, a um rosto virado. E foi minha ação de conversar com ele e trata-lo como um igual que pressupôs sua reação amigável e sua mudança de opinião em relação a “tijoladas” e estudos.
Assim como ele (o Wagner, como se apresentou para mim), inúmeros meninos somente reagem a atos de indiferença. Podemos não saber a dimensão de uma boa ação, de tratar seres humanos como iguais, como sabemos a dimensão de uma molécula. Mas, certamente, é muito maior do que pensa a nossa vã filosofia (ou vã ciência?). Digo novamente. Acredito nas relações humanas. Acredito nas experiências de vida e no poder de mudarmos o mundo a partir de um simples ato. E isso, me arrisco a dizer, ensina mais que a física. Quando fui embora, apertei a mão do Wagner. Ele, como reação, apertou a minha.