sexta-feira, 28 de dezembro de 2007

Por um ano diferente

2008 há de ser diferente. Já que todos dizem que deve ser, óquei!, há de ser. Entendi, na minha mais simplória interpretação dos colóquios, escritos ou falados, dessa época do ano, que de nada vale o que foi, só o que será.

A começar, eu juro, juro mesmo, não fazer a listinha de todos os anos. Listinhas aquelas que servem não para um bom ano, mas para um péssimo fim de ano. Listinhas só são úteis para chegarmos à simples conclusão do quanto somos bobos e que jamais cumpriremos metade do que escrevemos. A começar, 2008 não terá listinhas!

Depois de não fazer listinhas, também não farei regime, nem intercâmbio, nem... Na verdade não farei nada, já que nada estará na listinha e, portanto, nada terei de cumprir. Não precisarei ler mais, nem ser mais solidária, nem mais estudiosa, já que tudo será diferente... e não haverá registros.

Em 2008 vou dizer adeus aos preceitos e princípios. Não serei organizada, não serei correta. Na verdade, acho que não serei nada! Já que nada registrarei. Talvez não queira fazer aniversário, não queira dar oi, não queira nem comer. Um adeus às regras! Um adeus ao que foi bom, embora passado.

No ano que adentrará, não vou me apaixonar, já que será um ano diferente de todos. Não vou abraçar, não vou sorrir, nem serei responsável. Também não vou gostar do que faço, do que estudo e deixar pra lá essa coisa de otimismo. Talvez eu também não queira existir, nunca se sabe...

Vou fazer tudo diferente do que até hoje fiz. Tudo de cabeça pra baixo, pra não repetir 2007. Vou dizer pra mim mesma que 2007 não foi um bom ano, e que não alcancei não o da listinha, mas coisas ainda melhores.

Também não farei coisas novas, para que não me arrisque a errar. E não seguirei nada do que disse ou pensei até hoje (eu disse NADA!).

Também não falarei a palavra não. Não não não! Juro que não falarei!

E, repito, não farei essa bobagem de listinha...


Pensei em muito a escrever para desejar todas aquelas coisas boas para mais um início de ano que, embora alguns não acreditem, reinicia tudo. Reinicia desejos, votos, listas! Além de reforçar. Reforça amizades, amores, desejos e listas também! Mas li tanta coisa, gostei de tanta coisa, que não me atrevi ao trivial, e me rebelei (um dos itens da minha lista: a rebeldia!... ei! eu disse lista?)

Uma das coisas que li e gostei, e que gostaria de eu ter escrito, e que, é uma promessa de Ano Novo!, eu ainda escreverei tão bom quanto, é um texto do David Coimbra, que, faça um bem para se fim de ano e comece bem o próximo: leia! (aqui)
Um Ano Novo maravilhoso e cheio de clichês a todos!

"Neste fim de ano, o que desejo a todos é isso, que o passo seja certo, que a palavra seja macia, que o gole valha a pena, que o perdão seja pedido. E concedido." (David Coimbra)


[Atualmente, atribuindo a boa leitura a textos alheios, já que aqui a coisa tá feia... Mas em 2008 prometo escrever melhor. Tá na lista! :D]





quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

Cada coisa em seu lugar

Prevejo meu futuro. No meu casamento, uma amiga fará um discurso no qual enfatizará: "ela é um amor de pessoa, muito dedicada e bábábá... mas é chata de tão organizada". Óquei, a parte do "chata" fica por conta. Mas o "organizada" vai sempre imperar. Em algum amigo secreto, em algum Natal, em algum lugar do mundo, há de se pedir: "uma palavra-chave sobre o seu amigo". E o que dirão eu já sei.

Eu me definiria diferente, e assim diria: "praticidade". Eu sou prática, e nada além. As coisas no lugar não passam de um meio de instituir a organização sobre a bagunça. Organizar por fora, numa tentativa de organizar dentro.

Gabriel García Márquez, que, não fosse organizado não seria quem é, escreveu*, sob seu alterego, o que explicarei quando do tal amigo secreto – aquele da palavra-chave:



"Descobri que minha obsessão por cada coisa em seu lugar, cada assunto em seu tempo, cada palavra em seu estilo, não era o prêmio merecido de uma mente em ordem, mas, pelo contrário, todo um sistema de simulação inventado por mim para ocultar a desordem da minha natureza. Descobri que não sou disciplinado por virtude, e sim como reação contra a minha negligência; que pareço generoso para encobrir minha mesquinhez, que me faço passar por prudente quando na verdade sou desconfiado e sempre penso o pior, que sou conciliador para não sucumbir ás minhas cóleras reprimidas, que só sou pontual para que ninguém saiba como pouco me importa o tempo alheio".



* Em Memória de Minhas Putas Tristes.



quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

Quem acredita em Noel?

Na correria da minha primeira semana de férias – sim, eu disse correria – resolvi ceder alguns minutos do sagrado almoço à curiosidade. Seria hipócrita se disesse que minha ida à sede dos Correios era a mais pura intenção de boa moça. Fui pra ajudar, também; mas fui mesmo “dar uma conferida”, no meu mais alto grau de curiosidade jornalística.

As muitas cartas ainda não atendidas, no último dia em que estariam ali, me despertaram um desejo imediato de ser Papai Noel ou, em último caso, ser rica. Consolada em não ser nem um nem outro, li e reli “Querido Papai Noel” em letrinhas tremidas. Peguei uma carta na medida do meu bolso e do meu tempo, e assim dizia:

Senhor Papai Noel sou 1 menino de 3 anos. Moro com minha avó que é papeleira. E é viúva. Papai Noel será que o senhor pode me dar uma roupa e calçado (aqui, um Ç riscado sobre o S) e se possível uma cesta de comida pois se for atendido fico muito agradecido e feliz. Meu nome é Enrique moro Vila Armonia (número-tal, rua-tal).” (sic)

Não fosse o orgulho e a vaidade, uma lágrima teria manchado aquelas palavras escritas com tamanho esforço e vontade. E senti vergonha. Senti vergonha da minha falta de esforço, da minha falta de vontade. Deixei pra última hora e, por isso, só poderei ser Papai Noel pro Enrique. Pena o Enrique não saber que isso é recíproco.




Estava no e-mail que recebi da Liza:

Na vida a gente passa por três fases
- A primeira quando acreditamos no Papai Noel;
- A segunda quando não acreditamos;
- A terceira quando somos o Papai Noel!




terça-feira, 11 de dezembro de 2007

Uma Janela para o Futuro

Alta definição. Interatividade. E mais um montão de coisinhas que a gente não sabe pra que serve. Não, não falo da vida. Falo da TV Digital mesmo. O futuro, a evolução do homem chegando às nossas casas! Impressionante... A tal TV Digital só não é perfeita porque ainda não busca a cervejinha gelada. A imagem é perfeita, “como se estivéssemos olhando pela janela”, foi o que disseram no jornal.


Pois, então. Pensei que a TV era um meio de informação, entretenimento, para momentos de ócio. Riam de mim. Sou ingênua. Aquele aparelho em cima da estante da minha sala, quem diria!, é muito mais do que parece. É nela, então, que enxergamos e interagimos com o mundo? É nela que conhecemos a realidade? Pensei que fosse por aquele buraco no qual encaixaram um vidro.


Nossas janelas, agora, não servirão mais para ver passantes e dar “olás”. Aliás, para que sairmos de casa? A janela em cima da estante já mostra tudo. Mostra com mais detalhes a careca do Romário e as rugas da Glória Maria (que vai gastar mais com maquiagem, coitada). Fora a interatividade. Só com ela " vai ter diálogo", disse a família Nascimento. É a realidade ao alcance do controle remoto (e ai dele que estrague!).


Alguém ainda se debruça na janela para ver quem passa? Exceto a senhorinha que o faz desde a era da não-televisão, não – e olhe lá. Já que nossas janelas estão fechadas a mais não poder para evitar assaltos, vamos à janela em frente ao sofá. Na janela do passado vê-se mazelas, vê-se sofrimento e dor. É feio. Faz-se melhor ver – em alta definição – o mundo colorido da novela das oito e, credo!, as rugas da Glória.


Não condeno. Também não gosto de ver a vila sob minha janela todas as manhãs, mas vejo. Também, creio, janelas com grades não devem oferecer tão boa vista. É... a janela digital é mais segura - e pode ser admirada do conforto do sofá. Muito adequado...


sexta-feira, 7 de dezembro de 2007

No português é tudo igual

Em blockbusters a gente até nem liga mais. É normal ligar a TV chuviscada – ainda não digital e não interativa, portanto, só opcional no liga-desliga – nas segundas à noite e ouvir as mesmas vozes. Já não ligo. A Julia Roberts fala minha língua vernácula igual à Meg Ryan? Óquei, é filme dublado.

Eu devia ter-me abstido, no entanto, de ligar a TV naquela quinta à noite quando, feliz da vida, ouvira anunciar um de meus filmes preferidos e, ironicamente, francês. Não era um blockbuster, mas uma obra-prima. E obras primas são feitas para serem apreciadas em sua íntegra beleza. Nada de traduções. Como a um quadro que se olha e se interpreta a seu bel prazer e, como quisessem estragar seu encanto, um guia lhe explica o que o “autor quis dizer”. O autor... sei...

Só sei que não devia ter ligado a TV e, assim, não teria ouvido Audrey Tautou falando mais ou menos como uma “queridinha da América”. Seria engraçado, não fosse decepcionante. Os cenários eram os mesmos, as cores eram as mesmas, os fantásticos personagens eram os mesmos... mas não eram. Foi-se tudo o que outrora fora. Era simplesmente um filme americano em português. Todo o encanto perdido pela falta do tal mot just balzaquiano. Por um excesso de letras desnecessárias que ali estão apenas para que preencham um espaço vazio e que a boca não se mexa sozinha.

O mesmo acontece com os livros, mas nisso há de ter mais tato – e saber a língua-mãe do autor. Eu ainda não tenho.
Não sei... só sei que tive dó de quem assistia ao filme pela primeira vez e não teve, nem por um momento, o gostinho que eu tive... até aquela quinta à noite.


terça-feira, 27 de novembro de 2007

O dia em que voltei ao passado

Foi num domingo, como costumava ser há dez anos ou mais, mas também podia ser uma quarta. O lugar já não era a casa da vó em Santana – nem a pseudo-casa-da-vó na capital –, era mesmo um restaurante, uma dessas galeterias quaisquer, mas isso também não importava. A comida não era feita pelas genitoras faladeiras na cozinha apertada da minha casa, nem na da minha tia. Fingi não perceber esses detalhes.


O motivo era o aniversário de um tio, mas a maioria ignorava o fato – não se ouviram felicitações. Primos, tios e agregados. Daqui, de Santana, da Terra dos Esquecidos. Não foram todos - e isso fiz questão de perceber. Então (quase) todos foram prestigiar o solene e remoto momento que – não disseram, mas é certo – haviam extraído da memória: o encontro familiar.


Minha cabeça doía e pendia ora para um lado, ora para outro, em vias de ser desativada pelo sono. Mas aquele era um dia especial. Não era único, era melhor que único. Era uma lembrança boa que se concretizava em sorrisos outrora de Natais, Páscoas e almoços dominicais. Agora eram só sorrisos de saudade, de bom-te-ver.


Fingimos, por largas horas, que éramos o que fomos, embora soubéssemos que não éramos mais. Mas um disparate à toa não faz mal a famílias felizes. E assim, fomos crianças, irmãos, amigos novamente. A diferença é que sabíamos mais sobre computadores, filosofia, arquitetura. Sobre a vida, embora alguns tentassem fingir que não. Ninguém queria pensar em presente durante aquele passado bom.

Com a cabeça dorida, me conformei em descansar a fala. Só olhei e vi: de fato, não éramos os mesmos. Éramos mais do que fomos. Não menos por vermos pouco uns aos outros, não menos por nos abraçarmos pouco ou por não estarmos na casa da vó. Éramos mais. Mais saudade, mais afeto, mais família do que nunca.


segunda-feira, 5 de novembro de 2007

Psicologia Espelhar

Eu disse “ai tiiio!”, e ele me fitou como se a pecadora fosse eu. Mas meu ato impulsivo de juntar o papelzinho devidamente compactado (para que a sujeira parecesse menor) não foi só pensando nos meus netos. Na verdade, creio que sequer pensei. Só fiz. Porque, combinemos, não há que pensar diante de um papel voador cujo destino não é a lata verde. Há que agir!

Passada minha vontade de dizer barbaridades ao grosso vovô careca, então, sim, eu pensei. Pensei na desfaçatez humana sob aquela figura a quem palavra “respeito” – sem falar em “lixeira” – parece inexistir. Reconhecem-se as pessoas pela origem de seu lixo. Traduz-se “lixo no chão = desrespeito”. Sem falsa demagogia, carrego o meu até visar a lata. E garanto, não é difícil.


O tio me olhou de revesgueio até virar a esquina como se nada entendesse. Creio que não entendia (acreditem! algumas pessoas têm tremenda dificuldade de captar o óbvio). Talvez tenha esperado em vão que eu me rebaixasse ao nível do seu ato e gritasse um palavrão horroroso. Mas meu bom exemplo se estendeu até aí.

Até senti um breve orgulho de minha pessoa. Mas meu lado anjinho da consciência sussurrou que nada mais fiz que minha obrigação de gente consciente.

É simples. Funciona assim: respeite. Não dói.


A Caixa

Metódica, repete incansavelmente aquele velho ritual pré-sono. A garrafa metade vazia, metade cheia de água. O som toca o mesmo disco, cujas músicas foram sistematicamente colocadas uma após a outra num ritmo inversamente proporcional à sonolência. Os livros. A persiana baixa aos quatro dedos de tocar a janela. O despertador ligado para... quarenta e cinco minutos precedentes à saída. Vinte para estender o sono, vinte e cinco para os ritos matutinos.

Tudo em ordem.

O livro, periodicamente substituído sob a luz do abajur, é quase bíblico. Cerca de dez páginas por noite, às vezes mais. Depende do grau de assimilação. Comumente, na página cinco – às vezes antes – quando aquele mesmo disco toca aquele trecho da música que precisa ser cantada, os ouvidos monopolizam o setor sensorial e os olhos fogem às frases de Kafka, Márquez, Pessoa, ou seja lá o que esteja em suas mãos.

Os olhos inquietos então olham em torno enquanto a boca arrisca um inglês um tanto distinto ao que os ouvidos escutam. E, numa dessas peregrinações da visão, depara-se com o que as palavras que outrora lera lhe fizeram esquecer.

Ela está ali, em meio às semelhantes, e parece ter a ingenuidade de suas cores. Teria, não fossem as lágrimas que já causou, pensa.

Nunca lembra do que almoçou ou da última página que leu, mas se recorda como disponibilizou cada item naquele retângulo quase quadrado. Tudo deveria estar perfeito para ali não mais estar dias depois. E ali continua há meses. Sabe que dali só sairão para uma sacola preta levada semanalmente para longe.

Talvez fosse mais fácil se a quase quadrada não lhe parecesse tão útil. E tão bonita... Seria fácil fechar os olhos e manda-la junto a tudo na sacola preta.

Mas continua a olhar. Repetidamente, olhar. E, repetidamente, ela sabe que a dor de abri-la é maior que a de vê-la. Disseram-lhe, certa vez, que sofre mais quem o faz com vagar. Mas lhe teme a idéia de que tudo vá tão rápido como veio.

Pensa que melhor lhe convém deixar a caixa fechada, tudo fechado. Volta às cinco páginas. Dorme. Ela. A caixa.

quarta-feira, 10 de outubro de 2007

A vida quer passar

Diz-se que, quanto mais tempo preenchido, mais tempo preenche nossos dias. É como um ciclo vicioso incessante aos maníacos por tempo preenchido, aos que depressivos quando do ócio. Preguiça entra em nosso vocabulário quando paramos e... não tenho o que fazer! é o que pensamos. Então o corpo amolece como naqueles dias abafados de cidades úmidas e, enfim, nos damos, não porque queremos, minutos de descanso. Mas o tique-taque do relógio é incansável, o tempo não pára e nós, os non-stop, sabemos disso.

É bom ter feitos diários. É bom não ter intervalo de acesso, entre pensamentos úteis, para os pensamentos fúteis. É bom aproveitar dias, horas, minutos, segundos!, porque 'vai que não dá tempo pra fazer tudo!'. A vida é quase invisível aos olhos, tão rápido passa. Os segundos, afinal, foram feitos para serem sugados até o fim, ingeridos com vontade, mas a conta-gotas, para que demorem a cessar.

A pressa de viver é quase uma doença. As vítimas dessa obsessão têm o relógio como o principal inimigo da vida. Parece-lhes que, para viver, deve-se correr contra o tempo. O ideal seria quebrar todos os relógios e esquecer que as rugas estão se formando não tão lentamente, que as pernas um dia não suportarão caminhadas longas, que as pessoas não ficarão pra sempre, que temos fim. Infelizmente, esses são os pensamentos que recheiam aqueles raros momentos de ócio.

A vida quer passar e tentamos inutilmente bloquear seu caminho. Esticamos um pouco aqui, outro acolá. Dormimos hoje dez minutos mais tarde, já que dez minutos rendem mais dez palavras bonitas, mais cinco páginas daquele livro, mais dois assuntos entre amigos... mais um momento. Vivemos essa vida, já que a próxima é dúvida, e a eternidade, uma tentativa vã.


De Clarisse Lispector:

Eu sou antes, eu sou sempre, eu sou nunca. À duração da minha existência dou uma significação oculta que me ultrapassa. Sou um ser concomitante: reúno em mim o tempo passado, o presente e o futuro, o tempo que lateja no tique-taque dos relógios.

quinta-feira, 4 de outubro de 2007

Eu nasci na época errada

Apercebi-me do erro épico cometido pelo destino quando ouvia, em certa exposição histórica, certo balaio de músicas e notícias anos 60-70. Ouvia aquilo com sorriso de criança, com o ar de alguém cuja felicidade foi encontrada no mais suposto disparate. Alguém que descobriu que esteve sempre no lugar errado, e enfim encontrou seu lugar. Mas tão logo minha alegria infantil se transformou num saudosismo senil. Voltei a minha época física quando, com dificuldade, levantei daquela cadeira cujo desenho arremetia a minha então descoberta época espiritual. Tudo e todos me pareceram demasiado incomuns, demasiado atuais.

Ouvindo vozes roucas e suaves, transportei-me por alguns instantes à vida universitária de meus pais, quando pensava-se duas vezes (até três) no que deixaria de ser apenas pensamento para ser fala. Os estudantes gritavam e cantavam para criticar. Os ídolos eram Chico Buarque e Beatles, e não... deixa pra lá. Eu queria, por alguns instantes mais, ouvir os reis do iê-iê-iê e, ali mesmo mexer os pés e os ombros como fazem meus pais e como nós, que não vivemos Beatles, achamos ridículo. Por muito pouco, não me deixei levar pelas músicas de protesto e não saí gritando "diretas já" no meio daquela gente.

Eu acredito em outras vidas, talvez acredite porque queira crer que vivi o que nessa vida não vivi. Ainda não sei onde nem quando passei meus anos de glória, se em 20, 30, 40, se dancei o Charleston ou a dança dos meus pais. Eu queria, também, ter sido hippie e ter-me vestido à paz-e-amor, embora o “amor livre” e a marijuana não me seduzam. Os mais variados trechos da história me aliciam insistentemente. Talvez tenha vivido todos. Talvez deva fazer regressão.

Se minha alma não se apossou de outros corpos, nasci na época errada. Vivo como se tivesse assistido às partidas de Pelé e à viagem de Gagarin. Eu vejo e ouço como uma conservadora. Eu rejeito valores e a moda séculovinteum. Tenho espírito velho sob essa carcaça que insistiu em nascer na era dos computadores e do funk.

terça-feira, 18 de setembro de 2007

Bovarysmo

Tenho o mau costume dos idealizadores. Desde o alvor da minha infância, fui levada pelos livros de história aos mundos mais longínquos da imaginação. Imagino uma terra lindamente arquitetada a meu bel-prazer. Concebo as situações a minha vontade e pessoas a meu gosto, embora esteja sempre próxima do abismo da desilusão.

Súbito, vejo-me imaginando histórias. Predicados, objetos, ou o simples sujeito sem complemento causam-me estranhas sensações, e me pego criando narrativas completas. Pessoas que nunca vi são para mim aquilo que imagino que sejam, e nada mais. Sei as causas e os fins, mesmo que sequer tenha vivenciado os meios. Sei o pretérito e o futuro no meu mundo.

Quando pequena, queria que tudo fosse do meu jeito. E meu mundo wanna be era primoroso. Tudo exato e colorido. Todos diziam 'bons dias' e 'boas noites'. Todas as palavras eram belas. Não havia abóbora nem a cor roxa. Não existia dinheiro, pois era ele o causador de todo o abjeto. Eu seria eternamente criança e meus pais, eternos.
Quando um pouco menos verde, com a cabeça no travesseiro eu vivia uma linda história de amor com direito a cavalo branco. Eu viajava e tinha amigos até do Japão. Eu sabia mais que o refrão de Águas de Março e entendia o 2001 de Kubrick. Eu tinha lido todos os livros e acreditava em todas as pessoas, porque mesmo os políticos eram confiáveis. Conhecia-se a definição de respeito e pessoas eram mais relevantes que dinheiro. Não havia desentendimentos por convicção religiosa, política ou econômica. Nessa terra fantástica, eu entendia a mente humana...

Fui longe... e caí daquele abismo. Um dia me senti estrangeira, forasteira na minha própria criação. E tentei criar um mundo não tão distante, no qual se chegasse mais rápido. Tirei daqui e dali, facilitei a chegada, mas ali não restou muito além da minha busca pelo que preenche o nanana da música.

quinta-feira, 6 de setembro de 2007

"Bom dia, Senhor F..."

Descobri-me refém de mais uma peculiaridade, e me estou auto-terapizando(?). Uma daquelas dificuldadezinhas nas relações interpessoais que todos temos e escondemos de outrem e de nós mesmos. Mais eis que eu revelo a minha. Não tenho medo! Arcarei com as conseqüências. Meu problema é um tanto peculiar, diria, e sempre tive vergonha de revelá-lo, embora saiba que muitos já o perceberam. Agora, então, nota-lo-ão todos. Eu... bem... não consigo pronunciar nomes. É, assim mesmo, bem esdrúxulo.

Já costumava me enquadrar no grupo das pessoas levemente esquisitas pelos mais variados motivos, mas sempre me descobria não tão singular. Por mais que pensemos o contrário, há sempre alguém que compartilha conosco a angústia de uma peculiaridade. Como falar com um portador de óculos escuros. NÃO CON-SI-GO! Minha mente altamente desconfiada imagina os mais variados lugares para os quais meu interlocutor estará olhando. Imagino que ele não me olha. Sei que ele não me olha!(!!!) Enfim, fiquei neurótica. Mas, ao menos aí, descobri não ser única.

Bem, voltando aos nomes, minha boca só os articula quando de certo grau de intimidade. Não que não saia um “ei, Fulano!”. Até aí consigo, mas só porque um “ei, psiu!” é por demais estranho. Já quando o diálogo parte para o “Oi, F...”, “Bom dia, C...”, “Obrigada, Senhor B...”, a coisa fica feia, e o bichinho da esquisitice me cutuca. Vejo a facilidade com que todos o fazem, e sinto-me ainda mais freqüentadora da seção dos excêntricos.

Quem dirá os apelidos! Ai céus! Apelidos pertencem ao grupo das mais extremas intimidades interpessoais. Eu não sei chamar por apelidos, assim como o fazem aquelas pessoas altamente carinhosas e queridinhas que nem passam pela fase do nome, vão direto ao apelido. Fico indignada com pseudoconhecidos que proferem meu apelido assim, logo de cara. Quem pensam que são? Critico-as. Invejo-as.

Eu gostaria, francamente, de falar nomes. Mesmo porque, nomes são muito bonitos e merecem ser pronunciados. Eu gosto deles por demais, não pense que não. Vou pedir, rezar pro papai do céu que me conceda tal privilégio. E se ele não me ouvir? Se não souber que lhe falo? Afinal, não sei pronunciar nomes...

quarta-feira, 5 de setembro de 2007

O dia mítico

Eis o dia do aniversário. O dia mítico. O meu dia mítico. O meu dia.

Dias de aniversário deveriam ser só nossos. Nossos feriados. Penso que esse é um dia só meu no qual só eu sou especial. Seu melhor amigo pode estar de aniversário no seu dia. Não importa. Esse dia é seu. Azar o dele que tentou roubá-lo de você.

Queria ter mais dias míticos por ano. Mas, quem sabe?, eles não seriam tão especiais. Para mim, aniversários são como bolinhos de chuva. São feitos uma vez por ano, e isso faz deles tão especiais e aguardados.

Um viva ao dia mítico e aos bolinhos de chuva! Agora, (ambos) só no ano que vem...

domingo, 26 de agosto de 2007

Vou estar estando

Sabe quando um acontecimento se repete muitas vezes e nunca sabemos como proceder? Mas e sabe, pior ainda, quando você enfim descobre como proceder e o momento para o qual você está preparado não mais acontece? Pois eu sei. Esperei, esperei, e ele afinal veio.

Foi quando, de súbito, o telefone tocou.

- Olá, dona Luana. Aqui é do banco M...

“Ai, céus!”, pensei. E o carioquês mixto à agudez prosseguiu.

- A senhora foi sorrrteada e vai extar recebendo uma supervantagem do nosso banco. Baxta a senhora etcétera etcétere tal e nós vamos extar lhe enviando um superrrcarrrtão interrrnacional PLUS.

Taí! Se eu pudesse mudar uma só coisa no mundo, mudaria o telemarketing e seu venerado gerundismo. Não culpo as pobres moçoilas cariocas que me tentam com promoções furadas e erros lingüísticos. Como padres (perdão, Senhor!), elas devem participar das aulas preparatórias "Português Aplicado ao Telemarketing".

Mas enfim, pensei: “É agora!”. E aquele sentimentozinho (bem pequeninho mesmo, juro!) de vingança me encheu a alma. Arregacei as mangas e mandei:

- Olha... no momento não vou estar aceitando. Talvez vá estar considerando quando a senhora estiver aprendendo a estar falando português. No mais: não, obrigada!

Ai! Que alívio!


(*) Estariam meus posts virando Bosts?

quarta-feira, 22 de agosto de 2007

O que [não] é jornalismo

“Não! Não quero aparecer na TV”. Eis a resposta sucessora à “jornalismo” (que sucede “o que estudas?”). Cansada de ouvir abobrinhas verdes a respeito da mais curiosa e nebulosa das profissões, resolvi amadurecê-las um pouco aos mais leigos. Àqueles cujo conhecimento jornalístico não transpõe o Jornal Nacional.


Para começar, estuda-se mais para ser jornalista do que “a arte de segurar o microfone”. Elabora-se a notícia, pesquisa-se, entrevista-se, produz-se, edita-se... enfim, trabalha-SE! Embora não pareça que a Patrícia Poeta faça tudo isso, sim, ela faz. A gente também estuda na faculdade, e lê (muito!), e trabalha, e pesquisa, e entrevista... ufa!, e também respira, quando sobra tempo. Além disso, estudante de jornalismo é ensinado a pensar, mais do que mexer em FinalCut, Photoshop e PageMaker. E disso há provas. Nossa opinião é sempre a mais aguardada num colóquio cabeça durante um churrasco, mesmo que estejamos no primeiro mês de faculdade. Porque somos sempre "o jornalista da família".

Lição número dois: não alimentamos (não todos) a pretensão de ganhar milhões fazendo megarreportagens para o Fantástico. Nem viajar o mundo aos sessenta fazendo matérias sobre as ostras famintas da Patagônia. Eu, pelo menos, quero ter uma família normal e netinhos aos sessenta e, mesmo assim, ainda ser jornalista. Porque todos os jornalistas não cabem na redação global ou no "grupo RBS", que, embora tenha cinqüenta anos, não tem coração de mãe. Os jornalistas estão nas revistas, na web, nas assessorias de imprensa. Mas os competentes, é claro. Porque você vai encontrar algum por aí vendendo bala e vai dizer "não tem mercado". Mas eu conheço advogado "vendendo bala".

E o mais importante: jornalista tem diploma! Se não tem, sinto, mas não é jornalista. Caso fosse assim, minha mãe poderia dizer-se médica e meu pai, filósofo. E os próprios jornalistas poderiam exercer a economia, a educação física, dependendo de sua especialização. Claro, alguns não a tem. São os que sabem de tudo um pouco (e muito de nada), mas estudaram para tratar com categoria desse todo.

Formadores de opinião, exercemos a profissão mais bonita, mais compensadora, diria o mestre Chelkanoff. Somos a profissão do futuro! E todos concordariam, se a conhecessem como conhecemos. Mas vamos deixar assim. Vai que eles descobrem...


sexta-feira, 17 de agosto de 2007

Os Gigantes (à amiga Ana)

Por vezes, deparamo-nos com pessoas grandes (muito grandes!), as quais denomino gigantes. Todos conhecemos um, ou vários, mas alguns não os percebem. Porque, na verdade, eles são discretos e bondosos, embora lendariamente não o sejam. Quando os reconhecem, alguns temem sua grandeza, afinal, sentem-se pequeninos e insignificantes. Mas os gigantes sequer sabem que o são, e nós, meros mortais, sempre sabemos.

Esses dias, reconheci um (ou uma). Pois, às vezes, não os conhecemos, mas os descobrimos. O meu (A minhA) estava ao meu lado. Eles costumam esconder sua grandeza bem escondidinha, são humildes. Mas quando nós, os pequeninos, precisamos de um empurrãozinho horizontal, desvendamos seu segredo.

Os gigantes têm inteligência e coração proporcionais à grandeza. Os enormes problemas lhes parecem medíocres. As pessoas baixas lhes parecem ainda menores. De fato, sequer lhes percebem, pois sua superioridade os impede. Casualmente, tropeçam no caminho, pois não enxergam pedras por onde andam. Mas não caem. Continuam sua marcha.

Não sabia o que sentir diante de meu Golias quando o vi. Sabia-se frágil, e por isso se fazia forte. Admirei sua grandeza, e quedei-me sob a dúbia situação de me sentir a mais sortuda criatura, ou a mais ínfima. Decidi-me pela primeira, pois, olhando para cima, é mais fácil crescer.

quinta-feira, 9 de agosto de 2007

Ignoto-pseudo-inimigo

Humanismo e Cultura Religiosa. Mais um nome pomposo para uma cadeira pomposa da pomposa Universidade. Daquelas aulas nas quais entramos prontos para sair. Na qual o relógio parece atrair constantemente os olhos, como a um imã. Coisas obrigatórias são sempre ruins, quanto mais quando se distanciam tanto dos nossos objetivos. Aparentemente.

Descobri que Humanismo e Cultura Religiosa (vamos resumir, ok? Religião!) não chega a ser de todo mal, assim como inúmeras outras chatices a serem estudadas. Ou a serem vividas. Descobri que aquelas coisas aparentemente ruins podem ser boas. E nem sempre se distanciam de nossas verdades.

Segundo meu colega, “é preciso conhecer o inimigo para lutar contra ele” (frase proferida na própria aula de ´Humanismo e blá blá blá`. ). Não, a religião não é minha inimiga, que fique bem claro! Mas também não se caracteriza como grande amiga. Confesso que não sigo religiões e não pretendo seguir, embora respeite católicos, protestantes, judeus e tudo mais que vier. Mas, até minha não-crença (ou seja lá como isso se chama), deve-se basear em doutrinas, mesmo que elas sejam somente minhas.

Doutrinas, teses, contestações provêm de conhecimento. Há alguns meses, detestava berinjela. Mas só até experimentá-la. Se é que minha comparação é compreendida. Criticar a berinjela tem relação direta com criticar religião. O que diferencia, no meu caso, é a simpatia. Procuro conhecer e aceitar ambas como são, o que não significa que goste de ambas. Atualmente, gosto só da berinjela.

(*) Devaneios de um momento ocioso e oco durante o estágio.

domingo, 5 de agosto de 2007

Eternos Admiráveis

No cinema, na literatura, na televisão ou na música. Temos ídolos, isso é certo. Assistindo ao mestre Chaplin e seu admirável Führer Hynkel em O Grande Ditador, atribuí ainda mais importância a esses seres (quase) superiores. Estavam ali, configurados num só corpo, dois dos maiores ídolos históricos. Charles e Adolf. Cada qual em seu segmento, ambos num mesmo contexto. Cada um como ídolo em suas mais distintas definições.

Chaplin foi (e é) o grande do cinema. O que fazia pensar. Que fazia rir. O que ria do ídolo Hitler, O Grande de um país. O aspirante a Alexandre. O que não deixava pensar ou rir. Opostos, mas poderosos em igual conta. Aos seus idólatras, restaram heranças a escolher (e a pensar).

Os ídolos exercem poder. Os idólatras, deixam-se apoderar. Sem julgamentos negativos, que assim fique claro. Idolatrar é bom, desde que em doses homeopáticas e conscientes. Idolatrar sem exageros. Não saber o limite entre a razão e a paixão foi o grande erro dos idólatras de Werther, o melancólico personagem de Goethe (sim, idolatra-se também personagens). Ou alguns fãs de filmes de ação. Morrer ou matar, respectivamente, não é idolatria. É falta de personalidade. É burrice.

Já tive centenas deles. Idolatrei cantores, atores, escritores. Idolatro personagens (nesse caso, o mérito é de seus autores). Idolatro Chaplin, Márquez, Buarque, de Assis, Guevara. Mas, mais do que ídolos intocáveis, tenho ídolos na vida.

Ídolos são pessoas a quem tributamos respeito e afeto. São pais, mães e tios (sobretudo os meus). São amigos e professores. Todos merecedores de altares e de orações. Pessoas que conheço não só pelo que fazem, mas pelo que são. Aplicam-se a todos os contextos, segmentos e definições. São eles eternos e incontestáveis.

segunda-feira, 30 de julho de 2007

De quando acordei chorando

Tudo pareceu real. A dor no peito era real. A angústia era real. Não sei como. Só sei que acordei chorando.

Foi numa dessas viagens recheadas de risadas incessantes, palavras descontraídas e músicas alegres. Fugimos da realidade. Refugiamo-nos em Gramado. Eu e as amigas. Tudo era felicidade. Mas acordei chorando.

Dormi bem. A cama quentinha compensava o frio serrano. Os sonhos foram bons. Mas um me fez acordar chorando.

Sonhei que uma amiga (a das risadas, palavras e músicas) tinha me abandonado. Que me deixara sozinha não sei por que, não sei onde. Mas me abandonou e me deixou chorando. No sonho e no quarto.

Quando acordei, ela estava ali. Ali ao meu lado, tal como havia deixado. Senti alívio. E pensei nos sonhos. Poderosos sonhos. Desses que nos fazem acordar gritando, suando... ou chorando.

Alguns dizem que os sonhos são uma junção do que vivemos. Outras, uma idéia do que viveremos. Eu prefiro que não seja nenhum dos dois. Que minha amiga não me abandone. E que eu não mais acorde chorando.

quarta-feira, 25 de julho de 2007

Hogar, dulce hogar - Homenaje a una ciudad

Um país hermano. Uma história em comum. Idiomas e culturas semelhantes. Também há gauchos y a las personas les gusta el mate. Ouve-se música brasileira da melhor qualidade. Há tudo o que me fascina em minha cidade. E algo mais.

Por alguns dias, troquei os rostos melancólicos de minha fria cidade por ‘¡Buenos días!’ e ‘¡Holas!’ da ciudad fría. Me alegrava a visão das melhores panaderias, existentes em todas as esquinas. Comia medialunas, alfajores (los mejores!), muzarelas e fainás, que só lá existem.

Durante as noites de inverno, minha cidade pareceu-me fantasma ao caminhar a passos lentos no centro da ciudad. Personas caminham com seus mates e botellas com água caliente. Há sorrisos ao zero grau noturno dessa ciudad.

É inspiradora. De noite, as luzes fazem de suas muitas praças e sua arquitetura ainda mais belas. Sob a luz do sol, ou mesmo sob a chuva (que também é mais bela na ciudad) os plátanos secos nessa época do ano são monumentos complementares às lindas obras humanas. Os outdoors são raros. As ruas têm uma mão e os motoristas sabem o significado das faixas de pedestre. As avenidas são grandes. Tudo é muito grande. Complexo de país pequeno.

Também os sons da ciudad são mais agradáveis. As palavras hispanas têm musicalidade e mesmo os palavrões parecem elogios. Caminha-se pelas calles. Lêem-se periódicos e vêem-se películas. Comem-se duraznos, lechugas e zapallos. A lluvia cai sobre o paráguas (palavra preciosa!). O rojo não é roxo, mas vermelho. E tudo são cores mesmo num dia gris.

A ciudad tem aroma de infância e sabor de déjá vu. Os quioscos vendem caramelos que já não existem na minha cidade. As crianças se vestem como crianças e as jovens como jovens (embora os cabelos e as roupas sejam iguais). Os chicos são muy guapos. Mais guapos ainda quando proferem as lindas palavras vindas de Castilla. Os niños são obrigados a ir à escola (pública!) e usam graciosos uniformes.

Queria passar o resto de meus dias na ciudad, onde a palavra ‘peligro’ é pouco pronunciada. Onde há pessoas nas noites frias. Onde se come muy bien. Onde as casas preservam uma história e tudo é traduzido para a língua-mãe.

Senti-me bienvenida, como en mi casa.

Amo meu porto alegre. E agora, amo Montevideo.

quarta-feira, 18 de julho de 2007

Do paradoxo estendido na areia

Alguns pensamentos realmente me perturbam quando a cabeça enfim encontra-se com o travesseiro. Como qualquer ser humano, mesmo o mais altruísta, problemas pessoais assolam meu cérebro. A imaginação viaja a mundos só meus. Mundos egoístas. Mas, por vezes (e queria que fossem mais vezes), uma pontinha de angústia me machuca o peito. Penso que deveria ponderar sobre problemas comuns, e não só meus. Mas logo a sensação de incapacidade é mais forte. Volto ao pensamento egoísta. Sinto-me culpada.

Dos pensamentos que queria mais incômodos, e que resultassem em alguma mudança nos meus atos, é a tamanha diferença entre as pessoas. Entre seres de uma mesma raça. Longe de mim querer que o mundo seja padronizado. Queria que os pensamentos fossem padronizados, distribuídos em igual conta. Que todos tivessem direito a pensamentos tão egoístas e frívolos como os meus.

Fico perplexa – decepcionada, diria – como pessoas podem se preocupar tanto com a potência de seus carros ou com a cor de seus cabelos, ao passo que a maior preocupação de outras é sobreviver. Julgamo-nos com direito de viver nossos pensamentos privados ao passo que outros vivem privados de bons pensamentos.

Umas vivem no carnaval; outras, na fome total. Diria Herbert e Gil. E as carnavalescas não sentem culpa. Mundo tão desigual.


Um desabafo.

quarta-feira, 11 de julho de 2007

‘Para pessoas baixas’

Detesto salto alto. No duplo sentido da expressão. Saltos altos machucam o pé. E a alma. “Salto alto são para pessoas baixas. Pessoas altas não precisam de salto alto”, disse Juremir Machado da Silva em reportagem da Record. Genial, caro mestre.

De fato, pessoas altas já sustentam em si altura suficiente. Não precisam subir no salto para serem maiores. Sabem permanecer no mesmo nível de outrem. Pessoas baixas sobem no salto por vezes muito alto. E, sem saber equilibrar-se nele, caem. Caem feio.

Penso na humildade como a maior das virtudes humanas. Traz como companhia o respeito, a sabedoria. Sabedoria de quem tem ciência de que não sabe tudo, que tem muito a aprender. Sabedoria de quem sabe que mais vale olhar pra frente do que pra baixo.

Prefiro ser pé-de-chinelo. Pelo menos permaneço em pé... no duplo sentido.

terça-feira, 10 de julho de 2007

O Melhor da Festa

Amamos trailers. Todos nós. Trailers são aquele tipo de coisa das quais duvido que alguém não goste. Como pizza. Ou Havaianas. Todo mundo gosta (ou usa). Depois do início da sessão, poderíamos tranqüilamente chegar uns dez minutos atrasados. O filme só começa após os agora comuns comerciais e eles, os trailers. Mas não! Corremos para a sala de cinema para saborear o doce gostinho de saber antes o que nos espera daqui a umas semanas. Daqui a umas semanas, então, veremos o filme cujo trailer nos fascinou. E nos decepcionaremos.

Por que os trailers são melhores que os filmes? Eis a pergunta que me perturba em todos os “dez minutos antes”. Cheguei a algumas conclusões. A seqüência de cenas no trailer é mais bonita. A charmosa e simpática voz do narrador só existe no trailer. Os melhores ângulos do Johnny Depp estão no trailer (ops!). E o mais importante: a música sempre emocionante da bela seqüência só toca no trailer. Lembro de quando vi o do Peter Pan (adoro o Peter Pan!). Não sosseguei até ver a produção na íntegra e ouvir Clocks, do Coldplay. Esperei, esperei. Nada de Clocks. Gostei do filme. Amei o trailer.

Inteligentes foram os produtores dos Simpsons. Revelaram que o longa não tem nada a ver com o trailer. Produziram cenas exclusivamente para o trailer? Sim, produziram. Bem mais atraente.

Não deveríamos ver trailers. Trailers estragam qualquer filme, por melhor que seja. As melhores cenas do filme estão no trailer. E pior. As melhores cenas de um filme são sempre melhores no trailer que no filme. Não digo que nunca gostaremos de um filme cujo trailer já vimos. Mas poderiam ser melhores. Outra solução: proponho que vejamos só trailers.

*Quantas vezes repeti a palavra “trailer”?

sábado, 7 de julho de 2007

O Ponto Final

Penso constantemente a respeito da vida e suas razões. Queremos viver eternamente. Eu quero viver eternamente. Digo essa vida, nesse plano. Porque acredito no princípio espírita de outras vidas. Um ciclo finalizado apenas após alcançarmos a total evolução da alma. Por isso não creio que morrer (ou partir para outro estágio da alma) seja ruim. Ruim é perder alguém. Quando quem amamos parte para o outro estágio sem nos levar consigo.

O que faríamos para não perder quem amamos? Até onde iríamos para descobrir o elixir da longa vida e tardar perdas dolorosas? Se pudéssemos, se soubéssemos como, estou certa de que transporíamos todos os obstáculos para prolongar uma vida. Talvez faze-la eterna. Materializar o sonho de todas as pessoas que já sofreram pela morte. Ou seja, todas as pessoas.

Por que morremos? Talvez uma questão tão pertinente quanto por que vivemos?. Quem nunca refletiu sobre as razões da morte talvez não tenha pensado nas razões da vida. Talvez não tenha encontrado um sentido para a própria existência. Mas jamais compreenderemos ou aceitaremos que esta existência tenha um fim. Só sabemos que a natureza fez desse o nosso destino e assim o é.

Respeito culturas e religiões e suas maneiras de encarar idas e vindas a esse mundo. Culturas que fazem da morte um final para nossa história. Eu creio na morte como parte da vida. Como passagem deste para um lugar mais evoluído. Uma vírgula.


*Essa foi mais uma reflexão sobre Frankenstein. Para entender melhor, leia. Recomendo.

terça-feira, 3 de julho de 2007

Somos Frankensteins

Tive uma das melhores experiências da minha vida. Conheci a incrível e triste história de Frankenstein. Não o monstro verde com grandes parafusos na cabeça da minha imaginação e dos quadrinhos, mas o Frankenstein de Mary Shelley. No caso, o Frankenstein cinematográfico de Kenneth Branagh. Saí correndo e desesperada não de medo, mas atrás do livro. Nunca corri tanto atrás de um livro. Não encontrei. Sequer os vendedores da livraria sabem que existe um Frankenstein além das histórias em quadrinhos. Mas enfim, recomendo o filme. Para os não preguiçosos, leiam!

Frankenstein (que não se chama Frankenstein e, na realidade, nem nome tem) não é monstro. É humano. Humano um pouco diferente, diga-se de passagem, mas humano. Nasceu de forma peculiar. Um homem criado por um homem a partir de muitos homens. É o que é Frankenstein. Tem todas as características de um homem recém nascido (ou recém criado). Digo isso porque, assim como os homens nascem e não aprendem nada, mas resgatam o conhecimento do “mundo das idéias”, nosso humano não tão humano herdou a inteligência de sua matéria-prima e relembra suas muitas capacidades.

Mas sua personalidade não se resume a isso. Ao longo da trama percebi que mesmo Frankenstein é o produto do meio em que vive. Nós somos produtos do meio em que vivemos. Frankenstein recebeu características de muitos, mas não era esses muitos. Era único. E era bom. Ajudou pessoas até ser tido por monstro e retaliado. Fatores bastantes para aflorar péssimos sentimentos de qualquer um.

Somos Frankensteins. Nascemos de muitos. Somos resultados de características infinitas. Mas, como Frankenstein, não são elas as determinantes do nosso eu. Usamos aquilo que nos é dado da maneira que nos convém, da maneira que o mundo nos exige. Nas palavras do próprio, “tenho amor em mim que nem pode imaginar, e fúria, que nem pode imaginar”. Temos também. Usamos o que melhor nos couber.


05/07/2007 - Encontei o livro num sebo! Disponível para empréstimos.

quarta-feira, 27 de junho de 2007

O Maior Amor do Mundo

Outro dia, assisti ao O Maior Amor do Mundo, de Cacá Diegues. Ouvira falar muito sobre esse filme. Tinha muita vontade de vê-lo, pois não se tratava de um qualquer, mas de um longa-metragem de Diegues com o grande José Wilker. Recomendo. Mas serei sincera. O que realmente me levou a passar a noite de sábado em casa foi o título do filme. Pensei em várias possibilidades de enredo e de personagens para O Maior Amor do Mundo. Um título enigmático, uma produção surpreendente. Ele era tudo, menos o que tinha preconcebido na minha imaginação. Viajei, fui longe demais. E descobri o poder de um título.


Um título, um nome, tem uma força surpreendente sobre uma obra. Digo qualquer obra. De filmes a pessoas. Há quem não assista a um filme ou não leia um livro por causa do título. Existem títulos nada atraentes. Mas, se você consegue passar por cima deles, verá que são obras que valem uma boa análise. Hoje mesmo vi “O Quarteto Fantástico”. Não achei nada fantástico, mas é bom, apesar do preconceito que tinha. Acho o título horrível. Mas vale a pena ver.

Estendo essa força aos nomes de pessoas. Há nomes poderosos. Na faculdade, um dia nos deparamos com esse assunto. Quais de nós seriamos jornalistas de sucesso em função do nome. Sim! Nada de discussões sobre o potencial de cada um, sobre estágios, oportunidades. Mas uma discussão filosófica sobre nomes. Pensamos em quem teria um nome tão forte a ponto de concorrer com o David Coimbra* (eleito um nome digno de ser estampado na Zero Hora).

Alguns nomes são simples, mas o conjunto é avassalador. Eu, por exemplo, não gosto do meu conjunto. Não acho avassalador, apesar de gostar do individual. Queria mesmo ter o sobrenome de minhas avós. Seria, se assim fosse, da linhagem Meirelles-Preusler. Seria, não fosse o Duarte Fuentefria.


[Aposto que o título desse texto também remeteu os leitores a outro tema. Surpresa? Decepção? É o poder do título...]

*Roubo descarado da idéia da colega Giana Hahn.

sexta-feira, 22 de junho de 2007

Estréia

Como para tudo existe uma primeira vez, resolvi compartilhar minha primeira matéria em vídeo. Melhor dizendo, minha como colaboradora, pois devo tudo aos meus companheiros de reportagem (Francesca e Thales). Estou aprendendo com eles e entrando timidamente nesse meio mulltimídia.

No vídeo do programa CanalFam (do site Cyberfam) estão as duas matérias (ou melhor, uma e meia, pois com a segunda tivemos alguns problemas técnicos).

Caso seja, definitivamente, seduzida por esse novo meio (para mim) de ser repórter, publicarei as matérias aqui. Se depender da minha grande equipe de reportagem, acho que vou longe...

sábado, 16 de junho de 2007

Rotular é regredir.

Tudo na vida é inclassificável. Quero dizer, nada pode ser deveras “rotulado”. Cada dia me deparo com mais e mais estereótipos. Com patricinhas, emos, loucos... enfim. Rótulos de todos os tipos. Não acredito neles e não me encaixo em nenhum deles. O homem é um ser extremamente multifacetado, multiétnico, multicores, multitudo! Impossível classificar pessoas tão diferentes, por mais que pareçam iguais. Cabelos lambidos para o lado, roupas, tatuagens não definem personalidades. Pensava o contrário, até o dia em que resolvi usar allstar sem ser punk.

Reflito seguidamente sobre o tema: o que é ser louco? Louco é o rótulo mais conhecido, mais comum, e será sempre rótulo. Os emos sairão de moda, mas os loucos estarão sempre lá. Até onde vai o limite da razão? O que é ser normal? Tudo uma questão de padrões. De ideais de ser humano pré-estipulados por uma sociedade à procura da auto-aceitação.

Acho, no entanto, que essa tal auto-aceitação depende de aceitar o outro como diferente, com direito a ser diferente. Chato seria o mundo se fossemos todos iguais.

Penso num mundo muito mais interessante, mais colorido, com a multiplicidade. O mundo povoado por pessoas sem estilo, ou melhor, sem rótulo. Estilo sim! Estilo próprio, único. Estilo eu mesmo. O único rótulo que considero aceitável.

Academia Brasileira de quê?

Sempre me perguntei a respeito da utilidade da Academia Brasileira de Letras. Sinceramente, ainda não descobri. Mas estou certa de uma coisa. Se esta tem razão de existir, não existe de forma coerente. Digo isso por causa de uma comunidade no Orkut (hoje em dia, tudo vira comunidade no Orkut), cujo título é “Maurício de Sousa para a ABL”. Pensei: caramba! Que coerência! Quer alguém melhor para representar as letras no Brasil do que esse ícone? Maurício de Sousa representa a leitura brasileira. Melhor ainda! Representa a base, a raiz da leitura no Brasil. Falo de minha parte (e me arrisco a abranger a minha geração), aprendi a ler lendo a Turma da Mônica. Aprendi a gostar de ler lendo a Magali, o Cascão e o Cebolinha (sem esquecer do Louco, é claro).

Há quem vai me contestar, porque, afinal, “quadrinhos não é literatura”. Digo: é sim! É boa literatura. É literatura que ensina a ler e a viver. É literatura que desenvolve a criatividade. É muito mais literatura que alguns escritores que, após escreverem um livro (que sequer se ouviu falar) ganharam sua cadeira na Academia. Se fosse solicitada a listar cinco nomes de imortais da ABL, não chegaria ao terceiro. E aposto que a maioria das pessoas faria o mesmo. Não estou desmerecendo alguns deles que passaram ou ainda estão lá. Alguns são escritores maravilhosos, cuja admiração cultivo independente do número de sua cadeira.

Ouso, ainda, a incluir na minha lista de imortais acadêmicos o Ziraldo. Ziraldo também é literatura. Dia desses, me peguei lendo Flicts, a cor excluída que foge pra lua. É genial! Sem contar o periódico O Pasquim. Tenho quase todos os livros do Ziraldo em casa. Os que não tenho, perdi ou emprestei (e não mais voltaram). O que dizer então de Monteiro Lobato? Na certa, existe uma explicação pra um dos gênios da literatura recusar uma dentre as 40 cadeiras da ABL. “Mal comportado que sou, reconheço o meu lugar. O bom comportamento acadêmico lá de dentro me dá aflição”, disse em sua carta de recusa. Disse tudo.

sexta-feira, 15 de junho de 2007

Ululante

Adoro palavras. Palavras com significados bonitos, feios, interessantes. O único requisito é que pertençam à língua portuguesa. E que sejam palavras. Existem belas palavras. Basta perguntar a qualquer pessoa, intelectual ou não, letrada ou não, que logo uma avalanche de palavras são proferidas. Amor, amizade, afeto e, a mais pronunciada, a única, a brasileiríssima: saudade. Para mim não! Acho todas lindas, sem sombra de dúvida. Mas, se a Marília Gabriela me pedisse para dizer uma palavra, diria sem pestanejar: ULULANTE!

Não posso dizer ao certo o que significa. O Aurélio (Buarque de Hollanda, grande amigo nas horas de sufoco) diz se tratar de um adjetivo para “uivar”. Ulular é, portanto, uivar. Abstenho-me de significados. Só sei que a palavra é bonita, soa bem, sei lá!

Depois que descobri que Nelson Rodrigues também tinha alguma admiração pela palavra dos meus amores, passei a ama-la mais ainda, e ela não mais saiu da minha cabeça. “O Óbvio Ululante” é o nome de um dos livros do mestre Nelson. Se ele gosta, também gosto, principalmente depois de ter lido suas crônicas em “A Menina sem Estrela” (expressão da qual também gosto, mas essa já é uma extensão do assunto).

Chego a pensar, então, numa relação clara (ok! Talvez não tão clara assim) com a relatividade da beleza. Beleza é, sim, relativo, e não há quem me convença do contrário. O que é bonito para mim, pode não parecer aos outros. O mesmo digo do avesso. Amor, amizade, saudade, são belas. Para minha bisavó, por exemplo, palavra bonita era "merda", a qual deveria ser nome de gente, não palavrão. Mas, perto de mim, não ouse comparar nenhuma delas à charmosa ululante.

quinta-feira, 14 de junho de 2007

Muito além da física quântica

Nunca compreendi a física. Sempre fui uma “zero à esquerda” em ciências exatas. Nunca pude entender como esse ser estranho e milimetricamente (hoje, nanometricamente) calculado poderia influenciar minha vida. Sempre fui regida pelas ciências humanas e, sobretudo, pelas relações humanas. Mas dia desses pude comprovar, na prática, que tudo está interligado. Meus princípios emocionais estão intrinsecamente ligados aos princípios físicos, aos quais passei, a meu modo, a compreender.

Foi numa dessas Porto Alegres chuvosas, nas quais os rostos parecem um espelho do dia. Não via sorrisos. Não ouvia vozes. Mas uma voz veio falar comigo, perguntando se eu tinha uma passagem de ônibus. Um menino, cerca de quinze anos, conformado com minha resposta negativa à pergunta, puxou conversa comigo. O assunto? Os motoristas que jogavam água na calçada e a futura “tijolada” que um deles levaria como vingança. E eu, pacificadora como sempre, proferi aquele discurso de “não faça com os outros o que não gostaria que fizessem com você”. E assim, a conversa foi. E assim, ele me disse do desrespeito que sofria. Que para mim devia ser mais fácil, pois estudava, trabalhava. E assim, eu falei de sua possibilidade de crescimento e ele falou de sua possibilidade de estudar. Sim! Ele tinha possibilidade de estudar e utilizar aquela inteligência em projetos de vida, e não de vingança contra motoristas.

Mas eis o ponto onde quero chegar: a física quântica.

Muito temos ouvido falar desse outro bichinho estranho para cientistas humanos como eu. Filmes, livros, conversas e mais conversas. Moléculas do nosso corpo que interagem com moléculas externas e fazem daquilo que somos aquilo que o mundo é. E é sobre essa tal capacidade do ser humano de mudar sua vida, concretizando sua vontade por meio do pensamento, que quero falar. Não preciso acreditar e compreender esse tipo de estudo para ter certeza de uma coisa: são nossos atos que fazem o mundo. Isso vai muito além e é mais fácil de acreditar do que o fato de meu pensamento poder mudar meu futuro.

O menino que vi na rua provavelmente sequer ouviu falar em física quântica. Espero que um dia ouça, depois de ouvir meus conselhos de voltar aos estudos. Mas duvido que saiba o que é uma molécula ou que tenha parado para pensar sobre o sentido da existência humana. Mas há uma coisa que ele conhece melhor do que muitas pessoas: as relações humanas. Ele certamente sabe diferenciar tratamentos pessoais. Ele seguramente também não conhece o princípio da “ação e reação”, mas sabe reagir a um ato grosseiro, a um rosto virado. E foi minha ação de conversar com ele e trata-lo como um igual que pressupôs sua reação amigável e sua mudança de opinião em relação a “tijoladas” e estudos.

Assim como ele (o Wagner, como se apresentou para mim), inúmeros meninos somente reagem a atos de indiferença. Podemos não saber a dimensão de uma boa ação, de tratar seres humanos como iguais, como sabemos a dimensão de uma molécula. Mas, certamente, é muito maior do que pensa a nossa vã filosofia (ou vã ciência?). Digo novamente. Acredito nas relações humanas. Acredito nas experiências de vida e no poder de mudarmos o mundo a partir de um simples ato. E isso, me arrisco a dizer, ensina mais que a física. Quando fui embora, apertei a mão do Wagner. Ele, como reação, apertou a minha.